Opinião

Coluna | Agricultura 4.0: facilitar o acesso dos “digitalmente excluídos”

A agricultura 4.0 (ou Smart Farming / Digital Farming) é a digitalização do meio rural, a integração entre máquinas, homem e tecnologias digitais de ponta. A digitalização dos processos de produção vai além da simples mecanização do campo: as operações e decisões passam a ser orientadas com base em dados retirados do clima, da terra, da lavoura etc. O principal resultado de tudo isso? Aumento de eficiência no campo, redução de custos e aumento de produtividade. No entanto, quão democrático tem sido esse boom da agricultura 4.0 considerando o universo dos produtores rurais como um todo, e não apenas os grandes e altamente capitalizados?

Essa foi um dos principais pontos discutidos no evento «Agricultura 4.0 – Impacto da inteligência artificial e tecnologias disruptivas no setor agrícola» organizado pela FGV Agronegócios no dia 22/04 em São Paulo. Se por um lado me alivia que esse tópico tenha sido levantado pelo público e endossado por formadores de opinião como Roberto Rodrigues, Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV-EESP e Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento entre 2003 e 2006, por outro me preocupa que o caminho para evitar uma ‘concentração tecnológica’ no campo seja cada vez mais árduo de se contornar.

A revolução da digitalização no mundo rural já está acontecendo e é um caminho sem volta. O Brasil é um dos países com o maior número de ag-techs no mundo. Um estudo recente da SPVentures (https://agfundernews.com/brazil-agtech-market-map-338-startups-innovating-in-agricultural-powerhouse.html) mapeou quase 400 startups na área, em mais de 30 eixos de atuação. O Agrishow, um dos maiores eventos de agronegócio do país, se tornou palco para a promoção de maquinários 100% IoT. Roberto Rodrigues citou o exemplo de um maquinário conectado com inúmeros dispositivos capaz de alcançar 500 hectares por dia. “Mas ora, no campo não chega internet”, diz o fazendeiro interessado no produto. “Sem problema, nós vendemos a torre junto com o maquinário.” Para o grande produtor? Good deal, para o pequeno, um sonho distante e inacessível.

Esse foi um dos tópicos levantados durante a discussão do evento, e se por um lado parte da audiência considerava que o caminho era disseminar o máximo de tecnologia possível entre os grandes e que em algum momento os pequenos também teriam o acesso (“…para uma trader, é muito caro acessar o pequeno. Nós focamos em quem gera mais volume.”), por outro os participantes acenavam a um consenso de que o pequeno não poderia continuar de fora.

É neste cenário de concentração tecnológica que novas oportunidades surgem, inclusive a oportunidade para organizações do terceiro setor e poder público atuarem conjuntamente para facilitar o acesso dos “digitalmente excluídos” à revolução digital. Mas como fazer isso acontecer, quando a grande maioria de órgãos governamentais, ONGs e fundações ainda estão começando a entender como usar dados para apoiar suas próprias intervenções? Quando o mundo do big data exige competências que ainda não foram incorporadas pela grande maioria das organizações?

O dado só vira commodity (só tem valor) se você sabe o que fazer com ele. Hoje, com IoT e esse dilúvio de dados, mesmo os produtores tecnificados que têm equipes para trabalhar essas informações coletadas no campo ou conseguem contratar serviços especializados acabam se “afogando” com tanta informação.

Sozinho o pequeno produtor dificilmente quebra essa bolha digital. Tampouco o terceiro-setor conseguiria combater sozinho esse problema – não enquanto sofre para analisar seus próprios dados de maneira assertiva. A resposta? Um tanto óbvia, mas pouco explorada ainda entre os nossos pares na luta pela inclusão dos menos abastados: parcerias com ag-techs e o entendimento que juntos o terceiro-setor e as start-ups podem impactar positivamente no campo. Nós da Solidaridad temos atuado no âmbito da inclusão tecnológica no campo desde 2012, buscando novos parceiros e desenvolvendo soluções digitais in-house focadas na melhoria contínua dos produtores e na eficiência da assistência técnica.

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