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Estudo econômico identifica mudanças necessárias do uso da terra no cultivo de soja no Matopiba

Iniciativa liderada pela Fundação Solidaridad mapeou durante duas safras regiões produtoras nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia com o objetivo de apontar mecanismos e modelos que viabilizem a expansão sustentável
A pesquisa aponta alternativas de modelos de negócios para viabilizar a expansão de forma mais sustentável. Foto: Fundação Solidaridad

Considerada a grande fronteira agrícola, a região de Matopiba –  formada pelo Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia –  ocupa uma área total de 73 milhões de hectares. Com topografia plana propícia à mecanização, solos profundos e ácidos, mas com facilidade de correção, disponibilidade de água e clima favorável, o Matopiba foi alvo de uma corrida por áreas e gerou forte valorização do preço das terras. Com alto crescimento, hoje a região já é responsável por quase 12% da produção nacional de soja, o que gera preocupação, principalmente ambiental devido à expansão para áreas de vegetação nativa, que podem sofrer danos irreversíveis.

Com o objetivo de entender a atual dinâmica do uso da terra pelos agricultores e agricultoras, considerando as variáveis econômicas nas principais regiões de expansão da soja, a Fundação Solidaridad lança o Estudo econômico sobre a mudança do uso da terra em regiões produtoras de soja no Matopiba. A pesquisa, que contou com a colaboração da consultoria Agroicone, aponta alternativas de modelos de negócios para viabilizar a expansão de forma mais sustentável, conciliando rentabilidade com conservação do meio ambiente.

De acordo com Paula Freitas, Gerente de Cadeias Produtivas e Estratégias da Fundação Solidaridad, o estudo inédito ajudou a identificar o atual cenário do Matopiba, especialmente sobre a dinâmica da expansão agrícola no Tocantins e na Bahia. “Trabalhamos pensando sempre na produção sustentável. Por isso, o objetivo foi mostrar quais seriam os mecanismos financeiros ou combinações que poderiam gerar ao produtor alternativas de incremento na produtividade, mantendo o cultivo de soja em áreas já abertas e não avançando sobre a vegetação nativa”, detalha.

Entender a dinâmica da expansão da soja no Matopiba e mensurar financeiramente o ganho de produtores em diferentes cenários foram resultados possibilitados pelo estudo. Foto: Shutterstock

CONCLUSÕES

Ao longo do estudo, foi possível entender a dinâmica da expansão da soja no Matopiba, além de mensurar financeiramente o ganho do produtor em diferentes cenários. Adicionalmente, foram avaliados diferentes mecanismos como alternativas para cobrir o custo de oportunidade.

Para Camila Santos, Coordenadora do Programa Soja e especialista em carbono da Fundação Solidaridad, nota-se que não há um mecanismo único para impulsionar a adoção de práticas sustentáveis da sojicultura no Matopiba, mas uma combinação de diversas ações.  Segundo a especialista, há a necessidade de esforços por parte do setor produtivo e do governo para encontrar caminhos possíveis para orientar e fomentar a expansão agropecuária sobre áreas abertas, preservando aquelas com vegetação nativa.

No caso da soja, a indústria deve avançar em compromissos para reduzir o desmatamento e as emissões de carbono, criando e fortalecendo arranjos com produtores. Isso inclui pagamentos por Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e créditos de carbono, além de incentivar o aumento de  produtividade por meio de tecnologias como o Sistema de Plantio Direto (SPD) e a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF)”, conta.

Paula Freitas destaca a importância da implementação do Código Florestal para a preservação da vegetação e apoio à produção sustentável, ajudando a reduzir a incerteza jurídica que afeta negativamente o setor produtivo.  Além disso, a infraestrutura de armazenamento e de logística são questões  imprescindíveis, e podem se tornar obstáculos à expansão da soja sobre as áreas de pastagens. “Devemos  pensar a longo prazo, considerando as gerações futuras, conscientes da importância de garantir a resiliência da produção e a preservação dos ecossistemas. Conciliar produção de grãos e criação da pecuária em harmonia com a conservação é essencial para garantir a sustentabilidade da agropecuária no futuro”, considera.

MECANISMOS FINANCEIROS

Para melhor entendimento dos cenários, o estudo foi dividido em quatro etapas. A primeira abordou os mecanismos financeiros para expansão da soja e a implantação das práticas agrícolas de baixo carbono no Tocantins e no Oeste da Bahia. Como o crédito rural é a principal ferramenta de política pública para fomento do setor agropecuário, bem como a forma mais utilizada pelos produtores para financiar a produção, a pesquisa apontou que, nos últimos quatro anos-safra, os recursos contratados pelos produtores aumentaram 88%, passando de R$ 190 bilhões para R$ 357 bilhões.

De acordo com Camila, o crédito é um ponto muito importante a ser analisado diante do expressivo aumento no uso dos recursos. “O estudo revela uma grande oportunidade para que as instituições bancárias ofereçam créditos para práticas mais sustentáveis e a preservação da vegetação. E que essas instituições passem a financiar a expansão da soja em áreas já abertas, como as de pastagens degradadas”, diz.

Segundo Paula, devido ao potencial agrícola e a consequente valorização das terras na região, a compra e venda de fazendas se tornou um negócio atrativo e rentável. “Podemos concluir que diante da atual conjuntura de elevado preço das terras já ‘abertas’, tem sido economicamente viável o avanço da produção sobre áreas nativas. Por isso a importância de modelos econômicos e mecanismos financeiros que fomentem a expansão sustentável”, observa.

CUSTO COM MELHORES PRÁTICAS

Na segunda etapa, foram identificados os custos de oportunidades em diferentes cenários com a adoção de práticas de baixo carbono, além de terem sido feitas comparações nas regiões de expansão da soja. A dinâmica de conversão do uso do solo nos últimos anos também foi analisada, a fim de quantificar a área ocupada pelas lavouras de soja, pastagem e vegetação nativa. Adicionalmente, os padrões de expansão foram mapeados e analisados por meio da matriz de transição de uso do solo do MapBiomas, considerando as áreas aptas e informações do passivo e ativo ambientais.

A pesquisa apontou que os modelos financeiros de expansão da oleaginosa, praticados sobretudo na Bahia e no Tocantins, não são economicamente atraentes. Além disso, os demais modelos de expansão avaliados – compra de excedente de vegetação na Bahia e de expansão sobre excedente de vegetação nativa na propriedade em Tocantins – apresentaram indicadores econômicos favoráveis.  ”Esses dados indicam que há uma valorização das terras já abertas, o que pode incentivar a expansão para áreas de vegetação nativa. Por isso a importância de políticas públicas eficazes e de uma melhor organização do setor. Assim, seria possível reduzir a pressão sobre o Cerrado, contribuindo para sua preservação”, afirma Camila.

A análise foi dividida em quatro etapas, para que fosse possível observar diversos cenários detalhadamente. Foto: Shutterstock

CONVERSÃO DE PASTAGENS

Na terceira etapa, as barreiras e as oportunidades na conversão de pastagens degradadas na agricultura foram identificadas e analisadas, sob a perspectiva de mecanismos financeiros tradicionais. Foram apresentadas sugestões de ajustes de crédito rural e políticas públicas que possam  promover a expansão da soja em áreas já abertas, após identificar que os mecanismos existentes não estão sendo efetivos.

Entre os cenários, foram abordados a oferta da assistência técnica e incentivo à adição de Brachiaria, redução da taxa de juros do crédito rural de custeio, de investimento e do barter, além do aumento do prazo de carência das linhas de crédito rural. Dessa forma, possibilita ao produtor um menor impacto em seu fluxo de caixa nos anos iniciais. 

A quarta e última etapa, nomeada de business case, considerou os mecanismos financeiros e não financeiros para a expansão sustentável da soja em regiões produtoras. O objetivo foi estruturar cenários para a expansão do grão em áreas abertas – seja pela produção agrícola ou pecuária -, tornando-os financeiramente competitivos se comparados aos de avanço sobre a vegetação nativa.

SÉRIE DE ESTUDOS NO MATOPIBA

O primeiro estudo da Fundação Solidaridad no Matopiba foi divulgado em 2021, com enfoque sobre a dinâmica territorial da soja, mapeando o aumento da produção aliada à conservação do bioma. A publicação Potencial regional de expansão da soja no Matopiba revelou um conjunto de quase 50 municípios que pode absorver 67% do aumento previsto na produção conservando as áreas de vegetação nativa. Ainda que a região possua 6,6 milhões de hectares de áreas de pastagem com aptidão agrícola, sendo 4 milhões de hectares de pastagens degradadas, ainda há 4,6 milhões de hectares de Excedente de Reserva Legal (ERL) em áreas com aptidão agrícola.

Em 2022, foi lançada a pesquisa Balanço de carbono na produção de soja do Matopiba, que analisou o estoque de carbono nas áreas com vegetação nativa e os cenários melhorados em função das práticas de manejo adotadas e mudanças de uso da terra nas áreas cultivadas. Os dados revelaram  oportunidades para produtores e empresas do setor, comprovando que é possível manter a rentabilidade com a adoção de práticas de baixo carbono.

Paula Freitas

Gerente de Cadeias Produtivas e Estratégias

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