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Ampliar as abordagens territoriais: oportunidades e desafios na Amazônia

Os ecossistemas florestais são fonte de recursos econômicos, sociais e ambientais indispensáveis. Apoiam os meios de subsistência rurais, além de fornecerem serviços ecossistêmicos valiosos, como a conservação do solo, a regulação climática e o fornecimento de alimentos e água doce. Equilibrar as demandas de todas as partes interessadas para otimizar o manejo florestal é fundamental para evitar os impactos mais graves das mudanças climáticas. Dessa forma, a abordagens territoriais oferecem um caminho a ser seguido.

Em todo o mundo, aproximadamente 1,6 bilhão de pessoas dependem diretamente das florestas para sua subsistência. Embora a cobertura florestal seja de pouco mais de 30% da superfície da Terra, ela abriga até 80% da biodiversidade global e fornece importantes serviços ecossistêmicos que  ainda não têm o seu valor reconhecido.

Nas últimas três décadas, as taxas de devastação florestal a nível global diminuíram, mas o desmatamento em florestas tropicais, particularmente na Amazônia, continua com taxas alarmantes, impactando negativamente nas mudanças climáticas, nos meios de subsistência rurais e na conservação da biodiversidade. Abordá-lo de forma eficaz é uma solução climática essencial, pois em conjunto com as turfeiras, responde por 15% das emissões globais de gases de efeito estufa (GEE).

Fatores que impulsionam o desmatamento e a degradação florestal

A maior parte do desmatamento é resultado da expansão agrícola para a produção de commodities. Estimativas recentes sugerem que o mundo está perdendo cerca de 10 milhões de hectares por ano, predominantemente ligados à agricultura.

Existem quatro commodities globais que impulsionam o desmatamento. São elas:

  • Gado
  • Soja
  • Óleo de palma (ou azeite de dendê)
  • Madeira

O cacau, o café e a borracha são outros exemplos de insumos ligados à degradação de florestas. Há, ainda, outros vetores fora da agricultura, como mineração ilegal, incêndios e o desenvolvimento de infraestrutura e urbanização. No entanto, o desmatamento é um problema complexo que conta com fatores subjacentes, como mudanças demográficas, políticas institucionais e fatores sociais e culturais.

Esses aspectos impactam em vários níveis e envolvem uma série de agentes em todos os setores e fronteiras, tornando a degradação florestal um desafio difícil de ser enfrentado de forma eficaz por meio de intervenções isoladas.

O que são abordagens territoriais e por que são importantes?

No passado, as tentativas de abordar o desmatamento ocorriam predominantemente a nível de propriedade, nacional ou internacional. Os esforços de mitigação eram muitas vezes específicos do setor, concentrados principalmente em certas cadeias produtivas de commodities. No entanto, essa abordagem costuma desconsiderar alguns atores essenciais, como os governos regionais. A maioria das decisões sobre o uso da terra é definida em nível subnacional.

É importante que os governantes locais estejam engajados em combater o desmatamento por meio da melhoria do planejamento e mapeamento do uso da terra, fortalecimento dos marcos regulatórios, aplicação de políticas públicas, melhoria da distribuição da terra e mobilização de recursos financeiros e técnicos para a agricultura sustentável. Para garantir soluções duráveis e eficazes que atendam a interesses diversos, todas as partes interessadas precisam estar envolvidas: governos locais, setor privado, organizações da sociedade civil e cidadãos.

Uma abordagem territorial (AT) trabalha com um alto nível de envolvimento do poder público para conciliar objetivos sociais, econômicos e ambientais numa divisão administrativa, em nível local, municipal, estadual ou federal. As ATs são abordagens holísticas e colaborativas para reduzir o desmatamento e restaurar as paisagens degradadas, que integram muitas iniciativas, incluindo:

  • Estar alinhadas com estratégias, políticas e planos de desenvolvimento local;
  • Estabelecer sistemas de monitoramento e medição, relatoria e verificação (MRV);
  • Promover práticas sustentáveis de uso da terra, como a agricultura de baixo carbono;
  • Direcionar, mobilizar e favorecer o financiamento para o Desenvolvimento Rural de Baixa Emissão (DRBE);
  • Alinhar os órgãos do governo e serviços de assistência técnica às metas do DRBE;
  • Fortalecer a igualdade de gênero e a inclusão social.

As estratégias de DRBE são um tipo específico de AT que trabalha com as comunidades rurais, englobando um território para aumentar a estabilidade climática. As ATs complementam as ações das cadeias produtivas, que favorecem o investimento do setor privado, mas muitas vezes não têm o envolvimento necessário do governo para gerar um efeito de longo prazo que possa ser ampliado. Além disso, ajudam a abordar os vetores sistêmicos e as causas subjacentes do desmatamento e exigem que várias partes interessadas se unam para atingir um objetivo coletivo.

Os desafios e as limitações das abordagens territoriais

Historicamente, muitos dos esforços para reduzir a degradação florestal se concentraram nas cadeias de fornecimento de empresas que compram commodities de risco ambiental. Sendo de grande porte, muitas delas se comprometeram a eliminar o desmatamento de suas cadeias produtivas, mas os relatórios de progresso têm sido muito limitados – tornando necessárias iniciativas como a Supply Change, que está trabalhando para aumentar a transparência e a responsabilidade nesse âmbito. Embora os mecanismos baseados no mercado sejam um elemento importante para favorecer a conservação de florestas, também serão necessárias abordagens alternativas e complementares.

Quando implementadas com sucesso, as ATs podem agir em uma lacuna crítica nas atuais estratégias de redução do desmatamento e, ao mesmo tempo, melhorar a inclusão e democratizar o uso da terra. Ao envolver todas as partes interessadas e alinhar seus esforços, elas podem ajudar a superar as ações dispersas e isoladas que muitas vezes são o foco de todo o empenho para proteger as florestas remanescentes e restaurar as paisagens degradadas. Um de seus principais benefícios é a maior efetividade das políticas públicas, das regulamentações e dos programas para favorecer as metas do DRBE. Apoiar as pequenas e os pequenos agricultores a manter ou aumentar sua produção agrícola, melhorando a resiliência climática e reduzindo o desmatamento, é um desafio comum em muitas regiões tropicais.

Além disso, as ATs aumentam a possibilidade de planejar estratégias que abordem vários fatores, diretos e indiretos, da degradação florestal. Ao abordar uma série de aspectos, em vez de se concentrar em uma única causa, é possível promover impactos positivos mais amplos. As ATs também fornecem uma estrutura para a inclusão de um maior conjunto de atores, incorporando grupos historicamente marginalizados, como mulheres, pequenos agricultores, indígenas e comunidades locais. Além disso, consideram o compartilhamento de benefícios e quem está envolvido nos processos de concepção, nas plataformas e nas estratégias de implementação.

Abordagens territoriais: um exemplo na bacia do rio Amazonas

A sustentabilidade territorial — a transição bem-sucedida para o desenvolvimento sustentável em todas as divisões administrativas — pode ser alcançada por meio das ATs. O principal desafio é a falta de um método que sirva para todos, pois cada território é único e está em sua própria jornada em direção a produções que respeitem os recursos naturais. Em 2018, o Earth Innovation Institute, o Center for International Forestry Research e a Força-Tarefa dos Governadores para o Clima e Florestas realizaram um estudo de ATs em 39 regiões de 12 países da África, Ásia e América Latina. O estudo comparou nove elementos-chave de sustentabilidade territorial nessas áreas.

Os pesquisadores descobriram que a maioria das regiões ainda está nos estágios iniciais ou intermediários do progresso em direção à sustentabilidade territorial e necessita de apoio adicional para avançar nas estratégias de DRBE. Na América Latina, o progresso varia significativamente, e alguns dos sistemas mais robustos em vigor estão no Brasil.

Desde 2022, a Solidaridad procura mitigar o desmatamento por meio do projeto Amazônia Connect, uma parceria entre a Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional (United States Agency for International Development, USAID), o Earth Innovation Institute, a National Wildlife Federation e a Universidade de Wisconsin-Madison. O projeto visa ampliar a adoção da Agricultura de Baixo Carbono (ABC) e a Produção Livre de Desmatamento (deforestation-free production, DFP) e melhorar a conservação da biodiversidade em regiões da Amazônia que abrigam as áreas de abastecimento de empresas internacionais e nacionais. Ao longo de cinco anos, trabalhará nas cadeias produtivas do café, óleo de palma, pecuária e laticínios no Brasil, na Colômbia e no Peru.

O Amazônia Connect integra as abordagens territoriais com os esforços da cadeia para maximizar os efeitos positivos e desenvolver a capacidade dos governos municipais de adotar estratégias de DRBE que priorizem a ABC e a DFP. Como cada região envolvida na iniciativa está em um estágio diferente de progresso em direção à sustentabilidade territorial, as atividades do projeto são específicas para cada uma delas.

Por exemplo, no Peru, o trabalho consiste na liberação de financiamento para implementar estratégias de DRBE que já foram projetadas, publicadas e aprovadas pelos governos regionais mas que não têm os programas e planos necessários para serem realizadas. No Brasil, o foco é o desenvolvimento de programas territoriais de REDD+ para ativar o mercado de carbono florestal e gerar créditos confiáveis e de alta qualidade para venda no mercado voluntário. Já na Colômbia, o Amazônia Connect busca o desenvolvimento de uma estratégia de DRBE no departamento de Meta e na integração de ABC e DFP na estratégia do departamento de Caquetá.

Combater o desmatamento e a degradação florestal: um caminho promissor

As florestas tropicais têm um papel crucial no bem-estar ecológico, econômico e social do planeta. Apesar de um ligeiro declínio nas taxas globais de degradação florestal nos últimos anos, o desmatamento ainda representa uma ameaça significativa, especialmente nas regiões tropicais, onde é impulsionado principalmente pela expansão agrícola para a produção de commodities. As ATs, que reúnem várias partes interessadas, incluindo governos, comunidades locais, setor privado e organizações da sociedade civil, surgiram como parte da solução para esse problema complexo.

Ao aproveitar o poder das políticas públicas, dos regulamentos e de programas para apoiar os objetivos do DRBE, as ATs podem democratizar o uso da terra, aumentar a resiliência climática e fornecer uma abordagem mais holística para lidar com o desmatamento. No entanto, seus desafios e suas limitações, como custo, complexidade técnica e dependência da boa governança, precisam ser abordados para que sejam mais eficazes. Mesmo assim, elas oferecem um caminho promissor para a conservação das florestas, o desenvolvimento rural e o uso sustentável e inclusivo da terra.

Este artigo foi produzido graças à contribuição generosa do povo dos Estados Unidos da América por meio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID). O conteúdo deste artigo é de responsabilidade dos autores e não reflete necessariamente as opiniões ou posicionamentos da USAID ou do governo dos EUA.

Rodrigo Castro

Diretor de País

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