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Tradição familiar na produção de erva-mate em sistema barbaquá no RS

O plantio e o beneficiamento da erva-mate feitos de forma artesanal e passados de geração em geração se tornaram a principal fonte de renda da família Fonseca, que é apoiada pela Fundação Solidaridad
Com a companheira Ana Lúcia, Alcir cultiva numa área de 14 hectares o mate que se torna matéria-prima para produção em sistema barbaquá. Foto: Fundação Solidaridad

Residente na cidade de Machadinho, no estado do Rio Grande do Sul, Alcir da Fonseca, de 54 anos, provê o sustento de sua família como agricultor familiar. Entretanto, sua produção tem uma característica bem diferente de outras regiões do Estado: enquanto a maioria dos produtores se dedicam majoritariamente à produção de grãos e pecuária, a família Fonseca traz como sua marca a produção de erva-mate com valor agregado diretamente em sua propriedade, por meio de um sistema artesanal denominado barbaquá, quase extinto na região.

Quando tinha 22 anos, Alcir chegou a parar de beneficiar a erva-mate pronta para o consumo por conta do aumento das exigências da vigilância sanitária. Na época, não era possível receber a validação dos meios artesanais de produção, o que fez com que a família se tornasse apenas fornecedora de matéria-prima para a indústria.

Produzido pelo meu pai desde seus 16 anos, o barbaquá é preparado num galpão com um túnel, onde se seca a erva por meio do calor e da fumaça. Como eu sempre ajudava, eu tinha muita vontade de dar continuidade ao que ele começou, mas sem a licença, não seria possível vender”, conta o produtor.

Em 2022, a família finalmente conseguiu a aprovação da vigilância sanitária e voltou a produzir o barbaquá conforme sua tradição, sem precisar vender matéria-prima para a indústria. Hoje, dos 14 hectares da propriedade, 11 são voltados ao cultivo do mate, que se tornou a principal fonte de renda e passou a cobrir os gastos com outras culturas, graças ao seu valor agregado. Ainda este ano a família realizou sua primeira exportação, enviando 200 quilos de erva-mate para a Alemanha. E até o ano que vem, Alcir pretende expandir seu erval, dedicando-se exclusivamente à produção e ao beneficiamento da planta. Estas últimas conquistas têm deixado o agricultor familiar realizado.

O “sapeco” é uma parte crucial na produção da erva-mate no sistema de barbaquá, pois influencia diretamente nas características do produto final

Processo Artesanal

A qualidade do mate vem da manualidade presente em todo o seu processo produtivo. As folhas são tiradas do pé, separadas dos galhos e passam pela “sapecadeira”, onde perdem cerca de 20% de sua umidade – um processo delicado e crítico para a definição do sabor e da coloração final. O próximo passo é defumá-las em um galpão, a 85 graus durante 24 horas, onde são espalhadas e remexidas de quatro em quatro horas para que sequem uniformemente. Na finalização, as folhas são trituradas e colocadas num socador, onde são moídas e estarão prontas para o consumo.

Além do mate e do tereré de sabor intenso e defumado, Alcir, a esposa Ana Lúcia, o filho Lucas e a filha Débora – que mesmo trabalhando fora não deixou de contribuir com a lavoura familiar – também produzem sementes e mudas de Cambona 4. Isso permitiu que a família integrasse o projeto Territórios da Mata, realizado pela Fundação Solidaridad na região de Machadinho, tradicional região produtora de erva-mate, de duas formas: como produtores atendidos e fornecedores. A família recebeu assistência técnica durante o primeiro ano da iniciativa e, mais tarde, passou a prover as mudas que são entregues a outros agricultores. “Quem ganhou essas mudas poderá fazer um plantio caprichado e ter retorno por muitos e muitos anos, reconstruindo a natureza”, conta Alcir.

Além de beneficiar a erva-mate, a família Fonseca também fornece mudas para produtores da região. Foto: Arquivo pessoal

Alcir destaca a necessidade de ações que preservem os recursos naturais observando as alterações climáticas de sua região, como a ocorrência de geadas no mês de abril, longos períodos de seca e as inundações que assolaram todo o Rio Grande do Sul. Felizmente, a família Fonseca teve prejuízos menores, como a interdição das estradas da região e danos reversíveis à sua lavoura.

“A gente torce para que a Solidaridad continue trabalhando na nossa região e em outras regiões do país, reconstruindo a natureza. O maior exemplo da importância de cuidarmos dela  a gente tem aqui, no Rio Grande do Sul, infelizmente. Hoje estou com 54 anos e não me lembro de ondas de calor tão intensas quanto as que temos sentido recentemente, além da maior presença de pragas. Isso são sinais de desequilíbrio. E esse trabalho que a Solidaridad tem feito é muito importante para restabelecer a harmonia”, comenta.

Territórios da Mata

Realizado desde 2020, o projeto Territórios da Mata tem o objetivo de promover práticas agrícolas sustentáveis, unindo a restauração produtiva do bioma Mata Atlântica com o incremento de renda a produtores e produtoras de erva-mate. A iniciativa visa proporcionar a produção de erva-mate em Sistemas Agroflorestais (SAFs) e incentivar a conservação e recomposição da paisagem natural em Áreas de Preservação Permanente (APPs).

Gabriel Dedini

Gerente de Programas de Café e Erva-mate

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