Notícia, Pecuária

Estudo revela o potencial sustentável dos pequenos pecuaristas na Amazônia

Realizada pela Solidaridad e parceiros, pesquisa mostra como a pecuária de cria na região amazônica traz avanços econômicos e sociais e reduz as emissões de GEE

A melhoria das práticas agropecuárias e o aumento da produtividade dos pequenos pecuaristas de cria da Amazônia freiam o desmatamento e vêm acompanhados da redução das emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) na atmosfera, o que contribui para o alcance das metas brasileiras para a redução do aquecimento global. É o que aponta o estudo Os Pequenos Grandes: Desafios da pecuária de cria sustentável na Amazônia e o potencial dos Núcleos de Inovação e Aprendizagem (NIAs), realizado pela Solidaridad, Universidade de Wageningen e Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável (GTPS), em colaboração com pesquisadores da Embrapa. A pesquisa foi apresentada no dia 28 de maio, em São Paulo, e em 30 de maio, em Belém, durante o evento Pequenos Grandes: Pecuária rentável de baixo carbono na Amazônia.

Joyce Brandão, Raquel Motta, a Diretora Executiva da IDH no Brasil, Daniela Mariuzzo, o Diretor de Sustentabilidade da JBS, Márcio Nappo, e o pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Marcelo Stabile durante o lançamento em São Paulo, no auditório do Banco do Brasil.

A pecuária na Amazônia exerce um papel protagonista no meio rural, uma vez que quase um terço do rebanho bovino brasileiro se encontra na região. Somente entre 2003 e 2013, houve um incremento de 200% de cabeças de gado no bioma. Dados preliminares do Censo agropecuário 2017, produzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que só o Pará tem o quinto maior rebanho bovino do país, com quase 16 milhões de cabeças de gado. Concentra-se nas regiões sudeste e sul do estado, com destaque para os municípios de São Félix do Xingu, Itupiranga, Novo Repartimento e Marabá.

A pesquisa reforçou que o Brasil é o primeiro exportador mundial de carne, com 17% do mercado, e que a produção interna só é possível graças à participação expressiva dos pequenos pecuaristas: 30% da população de gado bovino está em propriedades rurais familiares. A partir da experiência da iniciativa Territórios Inclusivos e Sustentáveis na Amazônia, desenvolvida pela Solidaridad, o estudo demonstrou a viabilidade operacional e técnica da pecuária de cria – considerada o elo invisível da cadeia – no bioma amazônico e trouxe estratégias para escalonar práticas de baixo carbono tecnicamente rentáveis e socialmente inclusivas.

Pesquisadora da Universidade de Wageningen, Raquel Motta disse que o estudo analisou a pecuária de cria no sudeste do Pará e identificou experiências existentes para fornecer alternativas economicamente viáveis, ambientalmente sustentáveis e socialmente inclusivas para a intensificação da atividade na região. Criou-se, então, o conceito de Núcleos de Inovação e Aprendizagem (NIAs), que propõe três pilares de intervenção: ações de campo, como treinamentos coletivos e visitas técnicas contínuas e integradas; plataformas digitais e o uso de aplicativos, como o Farming Solution e o Extension Solution – criados pela Solidaridad para apoiar a escala e o impacto  nas atividades da assistência técnica –, e o fortalecimento de arranjos institucionais locais.

«Os NIAs permitem que o modelo ganhe escala, para que ele seja discutido por toda a cadeia, analisando a viabilidade operacional e financeira da sua implantação, em consonância com requisitos ambientais e climáticos. Se a pecuária de cria aumenta sua produtividade, conseguimos alcançar as metas da indústria, assim como de outros setores. E a união de esforços é um dos pilares da metodologia apresentada no estudo», comentou Raquel. Segundo ela, a Holanda e outros países da Europa se preocupam com a origem da carne oriunda do Brasil, para que tenha bases sustentáveis e rompa com o estereótipo de ser produzida às custas do desmatamento da floresta.

Para a Gerente de Programa da Solidaridad, Joyce Brandão, o estudo joga luz tanto no potencial de mitigação das emissões de GEE quanto nas oportunidades para os pequenos produtores de bezerros, que tem pouco acesso a conhecimento, assistência técnica e financiamento.

“Não podemos falar de desmatamento zero sem a melhoria das práticas agropecuárias. E os NIAs permitem, além do acesso a técnicas de gestão e produção, a oportunidade de incluir os pequenos produtores na cadeia de forma integrada. Isso faz com que eles demonstrem capacidade de escala nas políticas de baixo carbono e ajudem o Brasil a atingir suas metas de mitigação e responder aos desafios climáticos da atualidade”, disse.

Ela comentou que o modelo de pecuária apresentado reduziria em 75% as emissões de carbono por quilo de bezerro, o que corresponderia a 43% de redução das emissões de GEE por hectare por ano.

Desde 2015, a Solidaridad mantém em Novo Repartimento (PA) o projeto Territórios Inclusivos e Sustentáveis na Amazônia. Nele, mais de 150 pequenos produtores recebem assistência técnica para a recuperação de áreas de pastagens degradadas, além de promover a capacitação de técnicos da região. São usados sistemas agroflorestais com cacau e pecuária de cria de baixo carbono.

«Com os NIAs, a ideia é intensificar a pecuária e a produção de cacau com a ampliação das áreas de recuperação de pastagens, gerando mais renda e contribuindo para a conservação da floresta. É um ganha-ganha real», afirmou Joyce Brandão.

“O estudo é resultado de uma parceria institucional que valida o modelo integrado em desenvolvimento pela Solidaridad no Pará e indica caminhos para o ganho de escala e impacto positivo. Há também resultados intangíveis, como a permanência das novas gerações no campo, já que passam a enxergar novas oportunidades econômicas”, completou o Gerente de País da Solidaridad, Rodrigo Castro.

APOIO DA HOLANDA E DO PARÁ

Promovido pela Embaixada do Reino dos Países Baixos, o evento em Belém reuniu pesquisadores, empresários, produtores rurais, gestores públicos e representantes de organizações e academia. Juntos, debateram soluções para a cadeia produtiva da pecuária paraense. As autoridades dos governos do Pará e da Holanda presentes reiteraram o apoio a projetos que garantam a sustentabilidade dos processos, especialmente em relação à manutenção das áreas de florestas e à mitigação dos efeitos do aquecimento global. Em 2015, o Brasil assumiu o compromisso no Acordo de Paris que reduziria em 25% as emissões até 2025 em relação aos índices de 2005.

Segundo o Secretário de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará, Mauro O’ de Almeida, as questões climáticas não sairão da pauta, independente de outros governos. «É uma agenda mundial e precisamos inserir nossa pecuária e nossa agricultura nesse contexto», afirmou.

O Secretário de Desenvolvimento Econômico do Pará, Iran Lima, completou: «Queremos fazer parceria com vários países, mas queremos acessar estes mercados por meio de práticas que preservem a floresta e melhorem a qualidade de vida do homem amazônico».

O Assessor do Departamento de Clima do Ministério das Relações Exteriores dos Países Baixos, Mirko de Ponti, destacou que a Holanda busca importar commodities mais sustentáveis a partir de um trabalho conjunto de toda a cadeia. “Queremos investir em parcerias multilaterais com governos, empresas e sociedade na Amazônia, contribuindo para o combate ao desmatamento ilegal”.

Já o Ministro-Conselheiro da Embaixada do Reino dos Países Baixos, Roderick Wols, fez referência ao arcabouço jurídico. “Queremos estimular as cadeias produtivas do agronegócio que aplicam a legislação ambiental. É a parceria entre os diversos atores que gerará a riqueza que queremos”, afirmou.

Rodrigo Castro acredita que as reflexões feitas nos eventos de São Paulo e Belém trazem um novo olhar sobre a pecuária de cria na Amazônia. “Foram apresentadas alternativas concretas para uma cadeia produtiva com transformação e inclusão social. Portanto, posso dizer que aumentar a rentabilidade do setor e reduzir as emissões já são um novo paradigma”, disse.